Artigos e Curiosidades
17. Foi veiculada na televisão uma propaganda de uma marca de biscoitos com a seguinte cena: um jovem casal estava num mirante sobre um rio e alguém deixava cair lá de cima um biscoito. Passados alguns segundos, o rapaz se atira do mesmo lugar de onde caiu o biscoito e consegue agarrá-lo no ar. Em ambos os casos, a queda é livre, as velocidades iniciais são nulas, a altura da queda é a mesma e a resistência do ar é nula.
Para Galileu Galilei, a situação física desse comercial seria interpretada como:
(A) impossível, poque a altura da queda não era grande o suficiente
(B) possível, porque o corpo mais pesado cai com maior velocidade
(C) possível, porque o tempo de queda de cada corpo depende de sua forma
(D) impossível, porque a aceleração da gravidade não depende da massa dos corpos
18. A figura [ao lado] representa uma escuna atracada ao cais. Deixa-se cair uma bola de chumbo do alto do mastro – ponto O. Nesse caso, ela cairá ao pé do mastro – ponto Q. Se esta bola for abandonada do mesmo ponto O, quando a escuna estiver se afastando do cais com velocidade constante, ela cairá no seguinte ponto da figura
(A) P
(B) Q
(C) R
(D) S
Você, típico visitante do Pion, muito provavelmente optou pelas alternativas corretas – D e B, respectivamente. Entretanto, se escolheu a alternativa B na questão 17 ou a C na 18, saiba que o erro que cometeu é bastante comum e ilustra uma dificuldade que parte significativa de estudantes manifesta em sala de aula: a de se libertar de um senso comum que remonta à época de Aristóteles!
As questões reproduzidas acima são as de números 17 e 18 da Prova Objetiva do Vestibular de 1999 da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, UERJ. Os dados estatísticos sobre os resultados dessas duas questões foram analisados no artigo “A queda dos corpos e o aristotelismo: um estudo de caso do vestibular”, escrito pelo professor Francisco Caruso, da UERJ, e publicado na revista Física na Escola v. 9, n. 2, 2008.
As distribuições percentuais de respostas dadas às questões estão reportadas na Tabela 1:
Questão Poder de atração das alternativas
Número Gabarito A B C D Efetivo
17 D 2,20 34,70 12,56 50,48 33,00
18 B 7,71 37,25 42,20 12,79 16,00
Tabela 1 - Dados estatísticos relevantes sobre as duas questões. Fonte: Departamento de Seleção Acadêmica da UERJ.
Além do poder de atração das alternativas das questões, que é a percentagem de escolhas para cada uma delas, apresenta-se, também, o poder de atração efetivo, que é o valor corrigido do poder de atração da alternativa correta, considerando-se (descontando-se) a probabilidade de respostas ao acaso. Sendo assim, pode-se, de forma mais rigorosa, pensar que a Questão 17 foi respondida de forma correta e consciente por 33% dos candidatos e a Questão 18, por apenas 16%. Esses resultados são preocupantes e levam a reflexões sobre a abordagem, em sala de aula, dos temas tratados nas questões.
Um modo simples de apresentar o princípio envolvido na Questão 17 pode ser apelar para a brincadeira que se faz com as crianças sobre o que pesa mais: um quilo de chumbo ou um quilo de algodão?
Todo jovem se recente de um dia ter sido enganado por esta pergunta. Assim, fazer uma analogia entre a resposta errada dada a ela e uma possível resposta equivocada à indagação sobre o que chega primeiro ao solo (se lançados de uma mesma altura), uma bolinha de chumbo ou uma de algodão, não só facilitará o aprendizado como também sua fixação.
Já com relação à Questão 18, que apresentou um índice médio de acertos ainda menor, observa-se que 55% dos alunos foram atraídos pela resposta aristotélica, ou seja, acharam que a bola cairia atrás do barco.
Contra essa idéia, Galileu defendeu em seu Diálogo que a física deve ser a mesma para observadores que se deslocam uns em relação aos outros em movimento de translação uniforme.
Esse princípio de absoluta equivalência entre referenciais inerciais, concebido em uma época de primazia da mecânica, é a base do princípio da relatividade de Galileu, que implica o abandono de qualquer possibilidade de movimento absoluto. Pode-se ainda enunciá-lo da seguinte forma: Se as leis da mecânica são válidas em um dado referencial, então são igualmente válidas em qualquer outro referencial que se mova em translação uniforme em relação ao primeiro.
Para visualizar outros dados sobre as respostas dadas às questões e conhecer algumas alternativas de abordagem desses temas em sala de aula – retratadas em tiras de HQ –, leia o artigo original, disponível em http://www.sbfisica.org.br/fne/Vol9/Num2/a03.pdf
Assinar:
Comentários (Atom)

